MPF requer multas por falta de acesso remoto a benefícios para povos indígenas e tradicionais no AM
O Ministério Público Federal (MPF) pediu à Justiça Federal a imediata fixação do prazo inicial da multa à União, ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e à Caixa Econômica Federal por descumprirem decisão judicial que determinou a adoção de medidas para assegurar o acesso dos povos indígenas, quilombolas e tradicionais aos benefícios sociais, emergenciais e previdenciários diretamente das aldeias ou comunidades, evitando assim o deslocamento e as aglomerações nas sedes dos municípios do Amazonas.
Na manifestação apresentada à Justiça, o MPF pede também a aplicação de multa pessoal aos gestores do INSS e da Caixa Econômica Federal, ao ministro da Cidadania e ao secretário nacional de Assistência Social, por conta do descumprimento da decisão proferida na ação civil pública ajuizada pelo MPF em maio de 2020.
Caso a omissão dos órgãos continue e eles não cumpram a decisão, o MPF pede que seja determinada a suspensão ou bloqueio de todas as publicidades institucionais da União (Ministério da Cidadania), do INSS e da Caixa Econômica Federal – com exceção daquelas de caráter urgente e essencial – enquanto permanecer a omissão.
Além do acesso remoto nas aldeias e comunidades para recebimento dos benefícios, a ação do MPF trata também da segurança alimentar dos povos mencionados, com a entrega das cestas básicas ou compra direta da produção destes povos com redistribuição aos que se encontrem em piores condições.
Acesso remoto aos benefícios – Até o momento, nenhuma medida concreta foi adotada pelas três (União, INSS e CEF) para viabilizar o acesso aos benefícios sociais, emergenciais e previdenciários dos povos indígenas e tradicionais de forma remota, como requerido pelo MPF na ação civil pública e determinado em decisão judicial.
As filas na porta de estabelecimentos bancários, lotéricas e agências continuam no interior do estado e na capital e os deslocamentos constantes entre aldeias, comunidades e centros urbanos em busca dos auxílios e benefícios seguem constantes.
Em São Gabriel da Cachoeira, por exemplo, as filas na casa lotérica permaneceram, mesmo com a alta de casos de covid-19 e o colapso no sistema de saúde do Amazonas durante a chamada segunda onda da pandemia. Desde o início da pandemia, as grandes filas e a ausência de distanciamento social são registradas, com a presença constante de grávidas e crianças.
Ofício da Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (Foirn) relata o caso de indígena da etnia Baré, moradora da comunidade de Caná, no rio Negro, que foi até a sede do município de São Gabriel da Cachoeira para receber o benefício do Bolsa-Família. A viagem de Caná até São Gabriel leva um dia e ela informou que, quando está na cidade, fica na “Beira” – região da orla fluvial – em algum acampamento improvisado, exposta ainda a maior risco de contaminação.
Durante a pandemia, a indígena contou que esteve três vezes em São Gabriel da Cachoeira para buscar benefícios, mas conseguiu receber o dinheiro uma única vez. Nas outras vezes, não havia dinheiro suficiente na casa lotérica para fazer o pagamento, o que evidencia a irregularidade no abastecimento de numerário que muitas cidades do interior do estado ainda enfrentam. Tal situação se repete no estado do Amazonas todo, com indígenas, quilombolas, ribeirinhos e extrativistas.
Na manifestação apresentada à Justiça Federal, o MPF juntou fotos que ilustram a dificuldade no atendimento em municípios como São Gabriel da Cachoeira, Nova Olinda do Norte, Itacoatiara e até mesmo em Manaus, capital do estado. “A existência destes danos gerados aos povos indígenas e tradicionais pelo meio inadequado de acesso aos auxílios, benefícios sociais e previdenciários não é uma situação que surgiu com a pandemia, mas sim já era de amplo conhecimento da União e das requeridas (INSS e Caixa Econômica Federal) há quase uma década”, afirmou o MPF no documento.